HDL influencia a síntese e a absorção do colesterol
10/07/2012
Por Karina Toledo
Agência FAPESP – A sigla HDL, popularmente conhecida como
“colesterol bom”, tornou-se familiar até para quem não é da área da
saúde depois que diversos estudos demonstraram a importância dessa
lipoproteína na prevenção da aterosclerose e das doenças
cardiovasculares.
Acreditava-se que o efeito protetor da HDL fosse devido
principalmente à sua capacidade de roubar o colesterol presente na
parede das artérias e carregá-lo de volta para o fígado, para ser
reaproveitado ou excretado.
Mas uma pesquisa recém-concluída na Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (FMUSP) revela que as concentrações dessa
lipoproteína no sangue influenciam também a síntese e a absorção do
colesterol no organismo, além de estarem associadas à ação da insulina
no metabolismo da glicose. Os dados foram publicados na revista Clinica Chimica Acta .
“Compreender melhor o papel da HDL no metabolismo do colesterol é
fundamental, pois o benefício causado pelo aumento dessa lipoproteína no
sangue supera o malefício causado pela elevação da LDL (o colesterol
ruim)”, afirmou Eder C. R. Quintão, coordenador da pesquisa financiada pela FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Projeto Temático.
Segundo Quintão, os medicamentos existentes para combater o
colesterol atuam reduzindo a concentração de LDL (sigla em inglês para
lipoproteína de baixa densidade) e de VLDL (sigla em inglês para
lipoproteína de muito baixa densidade), que também têm a missão de levar
colesterol aos tecidos, mas ao atravessarem a parede da artéria ficam
presas e contribuem para a formação da placa aterosclerótica.
“O ideal seria desenvolver drogas capazes de aumentar a HDL no
sangue. A dieta e o exercício têm pouco impacto nesse processo. A
ingestão habitual de bebida alcoólica, embora eleve a HDL, provoca
aumento de mortalidade por causas não cardiovasculares”, disse o
pesquisador.
Para entender melhor como a HDL atua no organismo, a equipe
coordenada por Quintão selecionou entre mais de 800 voluntários
saudáveis recrutados na cidade de Campinas um grupo de 66 pessoas.
Metade dos voluntários tinha concentrações plasmáticas dessa
lipoproteína abaixo de 40 miligramas por decilitro (mg/dl) – teor
considerado baixo. A outra metade tinha concentrações de HDL acima de 60
mg/dl – teor considerado alto.
Os pesquisadores tiveram o cuidado de manter uma proporção
equilibrada de homens e mulheres nos dois grupos, bem como de selecionar
voluntários com a mesma faixa etária e com índice de massa corporal
(IMC) dentro da faixa considerada desejável. Foram excluídos portadores
de diabetes e outras doenças, fumantes, usuários de álcool e de
medicamentos que influenciam o metabolismo de lipoproteínas, entre eles a
pílula anticoncepcional.
“Criamos um protocolo que difere de toda a literatura científica até
então existente. Os demais estudos tinham fatores de interferência
indesejáveis, uma vez que incluíam voluntários com comorbidades como
obesidade ou diabete”, explicou Quintão.
Também foi feita uma análise detalhada do hábito alimentar dos
participantes. “Quanto mais verduras o indivíduo ingere, maiores são os
valores de fitoesterois no sangue – o equivalente ao colesterol presente
nos vegetais. Como esse foi um dos marcadores analisados no estudo, os
participantes tinham de ter uma alimentação parecida para não enviesar
os resultados”, disse.
Os pesquisadores da FMUSP então colheram e analisaram amostras de
sangue dos voluntários em busca de esteroides que servem de marcadores
da síntese e da absorção intestinal de colesterol.
Surpresas
A análise dos resultados mostrou que os voluntários do grupo com HDL
baixo sintetizam mais colesterol, mas absorvem menos essa substância
pelo intestino. Já os participantes com HDL alto sintetizam menos
colesterol, mas absorvem mais pelo intestino.
“Esse dado nos surpreendeu e nos pareceu incongruente”, afirmou
Quintão. Isso porque os estudos epidemiológicos mostram que pessoas que
absorvem mais colesterol pelo intestino têm mais risco de sofrer
infarto.
“É estranho que essas pessoas que absorvem mais colesterol sejam
justamente aquelas com HDL alto”, disse. Para solucionar o novo enigma, o
grupo de Quintão pretende seguir a linha de investigação, dando início a
um novo projeto de pesquisa.
Também surpreendeu os pesquisadores o fato de os voluntários com
valores baixos de HDL apresentarem menor sensibilidade à ação da
insulina quando comparados aos voluntários com HDL alto. Isso foi
avaliado ao se relacionar a concentração de insulina com a de glicose no
sangue em pessoas em jejum.
“Identificamos esse processo de resistência à insulina em um estágio
bem precoce. São pessoas saudáveis, sem sintomas e com IMC normal. Não
sabemos se daqui a dez anos haverá maior frequência de diabetes nesse
grupo. É uma possibilidade de estudo de longo prazo que se abre”, disse
Quintão.
Dados da literatura científica reforçam a hipótese de que quanto mais
elevado o HDL no sangue melhor é o aproveitamento da insulina produzida
no pâncreas no metabolismo da glicose em tecidos periféricos.
Em paralelo
Em outro braço da pesquisa, os pesquisadores investigaram várias
proteínas e enzimas que regulam a produção de HDL no organismo, entre
elas as lipoproteínas lipases.
“Essas enzimas quebram grandes partículas, como o VLDL produzido no
fígado e os quilomícrons originados da gordura ingerida, em partículas
menores como o LDL e o HDL”, explicou Quintão.
A pesquisa feita na FMUSP mostrou que pessoas com baixo HDL têm
quantidade menor de lipoproteína lipase periférica no sangue. “Isso
sugere que os organismos desses indivíduos estão transformando uma parte
menor do VLDL produzido e dos quilomícrons em HDL”, disse.
Já quando se mediu a enzima lipoproteína lipase produzida no fígado, a
relação foi inversa. Os voluntários com HDL baixo e maior resistência à
insulina apresentaram atividades de lipoproteína lipase hepática mais
altas.
Em outro artigo publicado na Clinica Chimica Acta, os pesquisadores analisaram os tipos de LDL presentes no plasma de 107 voluntários.
“Observamos que a presença de anticorpos contra LDL oxidadas, que são
as partículas mais aterogênicas, está relacionada à intensidade da
aterosclerose de forma mais significante do que a própria concentração
de LDL oxidada encontrada no plasma”, disse Quintão.
Até o momento, o Projeto Temático deu origem a outros três artigos
publicados, além de quatro projetos de iniciação científica, um
mestrado, dois doutorados, um pós-doutorado e sete projetos de
treinamento técnico – todos com Bolsa da FAPESP.
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