MEXA-SE!!!! Pesquisa mostra como a atividade física ajuda na prevenção de doenças metabólicas
Agência FAPESP – Pesquisa realizada na Escola de Artes,
Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP) desvendou
parte dos mecanismos metabólicos pelos quais a prática de atividade
física ajuda a prevenir problemas de saúde causados pela má alimentação,
como diabetes e acúmulo de gordura no fígado.
O experimento foi feito com camundongos que receberam uma ração
incrementada com chocolate, bolacha de maisena, amendoim e açúcar. A
dieta, batizada de Cafeteria, tinha o objetivo de mimetizar os hábitos
alimentares humanos, explicou a Fabiana de Sant'Anna Evangelista,
coordenadora da pesquisa financiada pela FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
“Padronizamos a dieta em um estudo anterior e vimos que após seis
semanas com essa alimentação os animais já desenvolviam um quadro de
intolerância à glicose, resistência à insulina e obesidade”, contou a
pesquisadora.
Embora o valor calórico da dieta de Cafeteria não seja muito
diferente – 4,23 quilocalorias por grama (kcal/g) contra 3,78 kcal/g da
ração normal – o teor de gordura salta de 4% para 18,74%. O valor
proteico, por outro lado, cai de 22% na ração padrão para 15%. As fibras
também são reduzidas de 6% para 3,24%. Já a porcentagem de carboidratos
das duas dietas é parecida, em torno de 55%, mas aqueles presentes na
Cafeteria têm maior índice glicêmico.
“Como essa dieta tem sabor agradável, desencadeia um comportamento
alimentar compulsivo. Os animais passam a comer por prazer, como os
humanos. Isso leva a uma ingestão calórica maior, aumento da adiposidade
e da glicemia e maior resistência à ação da insulina”, disse a
pesquisadora.
Para verificar se a prática de atividade física era de fato capaz de
prevenir esse quadro, os animais foram submetidos a um programa de
treinamento de dois meses, que incluía 1 hora uma de exercício físico
aeróbio na esteira com intensidade moderada, cinco dias por semana.
Os camundongos foram divididos em três grupos. O primeiro,
considerado o controle, recebeu a ração normal e permaneceu sedentário. O
segundo recebeu a dieta de Cafeteria e também não praticou atividade
física. O terceiro recebeu a dieta de Cafeteria e foi incluído no
programa de treinamento físico.
Enquanto o aumento de peso no grupo controle foi de 13,3%, nos
animais sedentários que receberam a dieta de Cafeteria foi de 21,3%. Já
os animais que praticaram atividade física tiveram elevação de peso de
8,7% e não desenvolveram hiperglicemia, intolerância à glicose ou
resistência à insulina. Além disso, tiveram um aumento bem mais discreto
nos níveis de colesterol.
“O interessante foi ver o que aconteceu no tecido adiposo dos dois
grupos que receberam a dieta de Cafeteria. Ficou evidente que o
exercício físico evitou a hipertrofia das células adiposas e a
consequente alteração da sinalização celular que contribui para regular o
metabolismo energético”, afirmou Evangelista.
Sinais confusos
Nos animais sedentários, as células adiposas hipertrofiadas passaram a
secretar mais substâncias pró-inflamatórias e menos adiponectina –
proteína essencial para o bom funcionamento dos mecanismos responsáveis
pela captação de glicose.
“Esse conjunto de alterações acaba levando à resistência à insulina. E
é só uma questão de tempo para esse quadro evoluir para diabetes do
tipo 2”, explicou Evangelista.
Os adipócitos hipertrofiados também passaram a produzir mais leptina,
hormônio responsável por desencadear duas importantes respostas no
organismo: inibição do apetite e estimulação do metabolismo energético.
“Mas quando a massa adiposa e a produção de leptina aumentam muito, o
organismo se torna resistente à ação desse hormônio por perda de
sensibilidade nos receptores e toda a sinalização de saciedade e gasto
energético de repouso fica comprometida”, explicou.
Como nos animais que praticaram exercícios o tecido adiposo
praticamente não aumentou, a leptina ficou estável e continuou
desempenhando seu papel de controlar o apetite e estimular o metabolismo
energético.
A análise do tecido adiposo mostrou ainda que os animais que
praticaram atividade física tinham concentrações maiores da enzima
citrato sintase, essencial para que as moléculas de gordura sejam
oxidadas para o fornecimento de energia. “A produção dessa enzima é
estimulada pela atividade mitocondrial, que aumenta com os exercícios”,
disse Evangelista.
O treinamento, portanto, não apenas aumentou o consumo de energia no
tecido muscular esquelético, como já era esperado, como também o
metabolismo energético no próprio tecido adiposo.
Balanço energético
De acordo com a pesquisadora, os animais sedentários alimentados com a
dieta de Cafeteria passaram a produzir em menor quantidade uma proteína
chamada AMPK, fundamental para o balanço entre a atividade lipolítica –
quebra de gordura para consumo – e lipogênica – armazenamento de
gordura no tecido adiposo.
Os pesquisadores verificaram que a dieta de Cafeteria induziu nos
dois grupos de camundongos o aumento da atividade lipolítica, ou seja,
mais moléculas de gordura estavam sendo quebradas e jogadas na corrente
sanguínea para serem transformadas em energia.
Mas como os organismos sedentários não têm maquinário adaptado para
oxidar esses ácidos graxos e usá-los como fonte de energia, os lipídeos
acabam indo para o fígado, onde podem se acumular e causar um quadro de
esteatose hepática. Uma parte da gordura volta para o tecido adiposo e é
reestocada.
“Embora os dados na literatura científica sejam contraditórios, a
redução da atividade da AMPK é frequentemente observada em diabéticos do
tipo 2 e obesos, e está associada à redução da capacidade oxidativa e
aumento da lipogênese”, disse Evangelista.
Já o grupo treinado alimentado com dieta de Cafeteria apresentou
aumento significativo da AMPK, contou a pesquisadora, e a repercussão
observada foi manutenção da lipólise aumentada, melhora na capacidade
oxidativa e menor lipogênese.
A pesquisa orientada por Evangelista deu origem ao mestrado de Talita
Sayuri Higa, realizado na Escola de Educação Física e Esporte da USP.
Os dados preliminares foram apresentados na 27ª Reunião Anual da
Federação de Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE), realizada em
Águas de Lindoia no mês de agosto, onde o trabalho recebeu menção
honrosa.
“O próximo passo agora é entender melhor o impacto dos exercícios no
metabolismo do tecido muscular esquelético para desvendar a cooperação
entre tecido adiposo e músculo esquelético para a prevenção de doenças
metabólicas”, contou Evangelista.
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